Se já se perguntou até que ponto a linguagem humana encontra semelhanças no mundo animal, vai achar interessante a recente descoberta envolvendo bonobos. Pesquisadores acreditam ter detectado em bonobos uma habilidade-chave da comunicação humana: a combinação de sons para criar novos significados. Esse achado, apresentado recentemente na revista Science, reaquece a discussão sobre como a linguagem pode ter surgido.
O estudo extenso nas florestas do Congo
Com mais de 400 horas de gravações de vocalizações de bonobos realizadas na Reserva de Bonobos de Kokolopori, situada na República Democrática do Congo, a pesquisa se destaca pelo rigor e colaboração entre especialistas de renome. O projeto foi liderado pelo laboratório do psicólogo comparativo Simon Townsend, da Universidade de Zurique, em parceria com o ecólogo comportamental Martin Surbeck, da Universidade Harvard.
A composicionalidade: chave para novos significados
No cerne da investigação, está a composicionalidade. Trata-se da habilidade de formar novas expressões combinando unidades de significados próprios. Linguistas veem isso como uma característica fundamental da linguagem humana, a força motriz por trás de sua criatividade e produtividade, segundo Simon Townsend. Até recentemente, provas desse fenômeno em outras espécies eram escassas.
- Estudos anteriores em Uganda observaram que chimpanzés tinham sequências vocais com significados diferentes de sons isolados.
- Ao juntar sons como “alarm-huu” (surpresa ou medo) e “waa-bark” (chamado à aproximação), pareciam criar mensagens indicando perigo e pedindo ajuda.
Novos padrões percebidos entre bonobos
Em uma fase avançada da pesquisa, os esforços se concentraram nos bonobos, parentes próximos dos chimpanzés. Sob a orientação da cientista Melissa Berthet, foram gravados 567 chamados individuais e 425 pares de vocalizações, utilizando uma checklist comportamental com 336 itens.
No retorno à Suíça, os cientistas recorreram a técnicas matemáticas inspiradas em sistemas de inteligência artificial, como o ChatGPT, para mapear relações entre sons e significados. Enquanto a maioria dos pares de vocalizações se aproximava dos sons individuais, indicando que sua união não alterava o significado, quatro pares se destacaram.
Esses pares sugerem que a combinação poderia originar um significado distinto. Por exemplo, a união de um grito agudo, geralmente usado para chamar a atenção, com um grito grave, caracterizado por reações emocionais intensas, gerou um novo contexto de significado.
Repercussões no meio científico
No mundo científico, as descobertas despertam reações variadas. Segundo a primatologista Federica Amici, da Universidade de Leipzig, tais estudos puxam as origens da linguagem para tempos ainda mais distantes do que era estimado. As distinções entre humanos e outros primatas, principalmente na comunicação, aparentam ser menos precisas do que se pensava.
No entanto, ceticismo também surge na comunidade acadêmica. O neurobiologista Johan Bolhuis, da Universidade de Utrecht, expressa dúvidas sobre a relevância imediata dos resultados para entender a evolução da linguagem humana. Apesar de intrigantes, os padrões nos bonobos não se equiparam à complexidade da linguagem humana que conhecemos.
Conclusão
Experiências com bonobos exemplificam como o estudo sobre linguagem animal ainda apresenta terreno fértil para descobertas. Se ficou curioso, vale a pena continuar de olho em futuras pesquisas, pois tanto os novos achados quanto o debate contínuo prometem ampliar nosso entendimento sobre as origens da linguagem, revelando quanto ainda se pode descobrir sobre nossa própria história evolutiva.
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